Silenciamento, intimidação, assédio, menos recursos para campanha, ameaças, deslegitimação são algumas formas de violência vivenciadas por mulheres que fazem política.
Para enfrentar esse problema, a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) lança, nesta terça-feira (26), o Guia Prático para Mulheres na Política.
A publicação reúne depoimentos e orientações para que esses casos sejam reconhecidos como violência, denunciados, com base na Lei 14.192, e ganhem repercussão na sociedade.
“Um aspecto essencial é o fato de que a desigualdade entre homens e mulheres é uma questão de direitos humanos e a violência política contra as mulheres precisa ser encarada como uma ameaça à democracia”, defende Mônica Sodré, diretora executiva da Raps.
No Brasil, as mulheres são quase 52% dos eleitores, mas nas eleições municipais de 2020, por exemplo, foram apenas 12% entre prefeitos eleitos, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Isso não tem a ver com falta de vontade, nem falta de desejo ou capacidade”, critica.
Mônica lembra que esse cenário é resultado de questões estruturais como machismo, fazendo com que a participação de mulheres em postos de liderança não seja estimulada e que haja muitas barreiras institucionais. “Não é incomum que mulheres em suas campanhas e disputas eleitorais tenham menos recursos que as campanhas de homens”, exemplificou a diretora.
Pesquisa da ONU Mulheres mostrou que o Brasil se encontra na nona posição entre 11 países da América Latina em relação aos direitos políticos das mulheres.
O guia traz o depoimento de 16 lideranças políticas brasileiras que relataram suas experiências e como enfrentaram situações de constrangimento, agressões e outros tipos de violência enquanto faziam campanhas ou exerciam mandato ou cargo político.
A partir desses relatos e da consulta a seis especialistas, a publicação mapeou os tipos de violência política - psicológica e moral, simbólica, institucional, sexual, física e patrimonial – e possíveis caminhos a serem tomados para combater o problema.
Além da cota definida para a eleição para participação do gênero minoritário, no caso o feminino, outras duas leis de 2021, a 14.192 e a 14.197, trouxeram um olhar específico para a violência política e a violência de gênero.
“A primeira combate a violência política contra a mulher com foco especial nas campanhas e nos mandatos, e a segunda adiciona ao Código Penal o crime de violência política, e é previsto de três a seis anos de reclusão para o agressor, multa e também a pena correspondente à violência”, diz Mônica.
Ela considera as normas um avanço, mas avalia que outras ações são complementares. A primeira delas é a educação para a equidade. “Em segundo, mudanças estruturais, as mulheres precisam estar nos postos de tomada de decisão, e isso é tarefa de todo mundo”, propõe.
Em terceiro, a diretora da Raps cita o respeito e encaminhamento de denúncias feitas pelas mulheres. Em quarto lugar, ter uma rede que permita a denúncia e também a punição. “É muito comum que uma mulher, ao fazer um boletim de ocorrência de uma violência sofrida tenha o boletim lavrado como um episódio de calúnia, de difamação”, cita.
Além de orientações sobre como reconhecer, reunir provas e denunciar, a publicação também traz um mapa com indicações sobre redes de apoio e autocuidado. “Denunciar é importante, mas a gente sabe que nem sempre é possível, e nem sempre é fácil, então a gente aponta ali um conjunto de caminhos, que podem fazer parte dessa trilha e podem complementar o aspecto da denúncia”, explica Mônica.
Ela relembra uma das ações da Raps, em 2020, que forneceu apoio psicológico gratuito para todas as prefeitas ligadas à entidade. Esses exemplos fazem parte do guia. A ideia é que outros relatos e contribuições possam ser enviados para novas edições.
Pesquisa do Instituto Alziras com 45% das 649 prefeitas eleitas em 2016 mostrou que 53% delas já havia sofrido assédio ou violência política pelo simples fato de ser mulher e 30% sofreu assédio e violências simbólicas no espaço político.
“Identificar quando esses episódios acontecem nem sempre é fácil. Saber o que fazer também não é simples. Esse guia dá uma contribuição concreta que é ajudar mulheres, independentemente de onde estão e de onde queiram estar, a ter caminhos efetivos para se posicionar quando esses casos acontecerem”, explica Mônica.