Deputadas da Comissão de Legislação Participativa da Câmara pretendem se reunir com o relator do Orçamento da União de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), e a equipe de transição do governo federal na tentativa de recompor imediatamente o corte de 95% nas despesas não obrigatórias do Sistema Único de Assistência Social (Suas). O anúncio foi feito nesta quarta-feira (9) pela deputada Erika Kokay (PT-DF), logo após audiência pública em que especialistas apontaram risco de colapso no atendimento à população mais vulnerável.
“Para que nós possamos traduzir o que foi discutido aqui e levar para quem tem poder para mitigar o verdadeiro desastre que é essa peça orçamentária no que diz respeito à assistência social, que dialoga todos os dias com o Brasil invisibilizado, com o Brasil profundo”, disse a deputada.
Na audiência, o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e o Fórum Nacional de Secretários de Estado de Assistência Social (Fonseas) denunciaram a fragilização do SUAS desde 2019.
A procuradora-regional da República Zélia Pierdona mostrou a gravidade da situação, sobretudo diante do aumento das filas nos Cras e Creas, que servem de centros de referência à população vulnerável, e dos 13,5 milhões de brasileiros que vivem na extrema pobreza, segundo dados do Banco Mundial.
Desfinanciamento
O presidente do Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (Congemas), Elias Oliveira, afirmou que o SUAS “está entrando em colapso por desfinanciamento contínuo”. Como o orçamento do setor não entra nas chamadas despesas obrigatórias da União, Oliveira também criticou as escolhas orçamentárias do atual governo federal.
“É inegável a importância da transferência de renda, mas com transferência de renda sozinha – sem equipamentos e unidades públicas capazes de oferecer proteção, acolhida e cuidado à população brasileira – nós estamos fadados ao fracasso. Orçamento é escolha e a escolha do governo foi não financiar: a compra de Viagra e de prótese peniana também não é obrigatória, mas se gastou mais com isso do que se gastou com assistência social”.
Teto na LDO
Representando o Ministério da Cidadania, a secretária nacional de assistência social, Maria Yvelônia Barbosa, explicou que as dotações de 2023 obedecem a tetos estabelecidos na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Mesmo classificando o sistema de “robusto”, Yvelônia admitiu a necessidade de recomposição no orçamento do SUAS diante de novos desafios.
“As próximas gestões precisam repensar essa rede, que já é robusta, mas que precisa se tornar ainda maior, já que hoje temos demandas – como as situações de proteção especial – em que verificamos que não é mais algo necessário apenas em municípios com mais de 20 mil habitantes”, disse.
Integrante da Frente Nacional em Defesa do SUAS, Ana Lígia Gomes rebateu a qualificação de “rede robusta” e afirmou que a atual gestão regrediu o sistema aos padrões da década de 1990.
“É um sistema hoje desidratado, encolhido e com trabalhadores precarizados. Alguns chamam isso de ‘voucherização’. Queriam fazer isso com a saúde também: ‘pega o dinheiro e vai comprar’. Não são elas (as populações vulneráveis) que vão atrás de um aplicativo: elas precisam ser acolhidas, recebidas, escutadas”, disse.
Solução
Durante a audiência houve absoluto consenso em torno da defesa da proposta (PEC 383/17) que altera a Constituição para garantir recursos permanentes ao Sistema Único de Assistência Social. O texto está pronto para votação no Plenário da Câmara. Autor da proposta, o deputado Danilo Cabral (PSB-PE) é coordenador da Frente Parlamentar em Defesa do SUAS e disse que a medida é uma solução “estruturante” para evitar que o setor tenha que “passar o pires” todos os anos em busca de financiamento.
Outra organizadora da audiência, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), que é assistente social, criticou o “descaso e esvaziamento” da área no atual governo. Ela aposta na retomada das políticas de transferência de renda alinhadas a um conjunto de políticas públicas a partir de 2023.