Entidades técnicas ouvidas nesta quinta-feira (10) pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados pediram a revogação das últimas resoluções editadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) que definem diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores. Um relatório sobre o tema será enviado pelo colegiado ao ex-ministro Henrique Paim, que coordena a área de Educação da equipe de transição.
Em agosto, o CNE (órgão que assessora o MEC) ampliou o prazo limite de dois para quatro anos para a implantação da Base Nacional Comum (BNC), atendendo à demanda de entidades educacionais que pleiteavam aprofundamento do debate sobre a política proposta.
Durante a reunião na Câmara, os especialistas avaliaram que essa decisão, na prática, suspende a vigência da BNC e que, portanto, o próximo passo a ser adotado pelo novo governo seria o de revogar as resoluções CNE/CP 2/19 e CNE/CP 1/20, que tratam respectivamente da formação de professores e da formação continuada.
Currículo mínimo
Uma das críticas é que a atual base curricular inspirada no modelo australiano estabelece a formação de professores por meio de competências e habilidades, com a divisão entre grupos com carga horária e conteúdo preestabelecidos.
Na opinião dos especialistas, essa divisão retoma a ideia de um currículo mínimo, que representa uma visão restrita da formação de professores ao retirar das universidades a autonomia para gestar seus cursos.
“As universidades e os cursos não devem se adequar ao currículo da resolução de 2019, uma vez que este documento está em revisão”, sustentou a presidente da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope), Suzane Gonçalves.
Para a pesquisadora, a atual base curricular é “uma camisa de força aos coordenadores de curso”. Ela defende que a formação de professores deve ser pautada por uma base comum nacional: um conjunto de princípios que balizam a formação de professores nas diferentes instituições, e que não se caracteriza por conteúdo mínimo.
“A ideia da gestão democrática desaparece da formação de professores a partir da resolução de 2019 e da resolução da formação continuada de 2020”, reiterou.
Nas mesma linha, a representante da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) Míriam Fábia Alves defendeu a revogação da norma atual e a adoção da base curricular proposta em 2015 que, segundo ela, permite aos profissionais de educação maior autonomia durante o processo de formação, à medida que opinam sobre o conteúdo do currículo.
Ela observou ainda que a edição de novo currículo foi feita sem que as mudanças iniciadas em 2015 estivessem consolidadas.
“Esse é um processo [de formação de professores] que demanda todo um conjunto de lutas e disputas no interior das nossas instituições, porque é um processo de maior seriedade dentro das universidades”, disse.
Mais debate
O representante do CNE Luiz Roberto Liza Curi, por sua vez, reiterou a necessidade de consulta e debate sobre o tema com as entidades educacionais.
“Nós não prosseguiremos, a partir dessa suspensão, sem debate e sem reordenamento dos pontos necessários ao atendimento do consenso formado sobre os direitos dos egressos [professores] atribuírem a si uma formação cultural consistente”, disse.
A representante do Movimento em Defesa da Pedagogia, que mobiliza profissionais de 15 estados contra a resolução, Lisete Jaehn, também reforçou a importância do diálogo.
“Nós queremos uma política de formação de professores que seja construída em diálogo com os cursos de licenciatura, com as entidades acadêmicas e científicas e com as instituições de ensino superior”, disse. Ela acrescentou que a pedagogia como uma licenciatura plena pode ser extinta, caso seja mantida a atual base curricular.
Nomeações ao CNE
Favorável à revogação, a deputada Professora Rosa Neide (PT-MT), que solicitou o debate, criticou a atual composição do CNE, para o qual foram designados nove novos membros, de um total de 24, nesta terça feira. A parlamentar acredita ser urgente mudar a composição do órgão.
“Um conselho onde a população e as entidades diretamente envolvidas não estão representadas não publica nada que dialoga com a base do que fazemos no dia a dia, nas universidades e nas escolas brasileiras", disse.