Mais investimentos em prevenção e tratamentos podem mudar o curso da escalada da obesidade no país. O alerta foi dado durante sessão solene nesta quinta-feira (16) em homenagem à Campanha de Conscientização sobre o Mês da Obesidade. No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, um entre quatro adultos está acima do peso, um grupo que soma 41 milhões de pessoas.
Em mensagem lida em plenário, o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), classificou a obesidade como a principal doença não contagiosa do mundo e apontou o aumento do problema entre crianças e adolescentes.
Vários deputados que são médicos se pronunciaram sobre a importância de diminuir o percentual da população obesa. Autor do requerimento para a realização da sessão solene, o deputado Dr. Zacharias Calil (União-GO), salientou as consequências do peso excessivo e fez um panorama da obesidade no mundo.
“Sabemos que a obesidade é um fator de risco para o surgimento de muitas outras doenças crônicas não transmissíveis como as cardiovasculares, diabetes, alguns tipos de cânceres. Dados de 2022 da Organização Mundial da Saúde estimam que existe em torno de 1 bilhão de pessoas com obesidade no mundo. Desses, 650 milhões são adultos, 340 milhões são adolescentes e 39 milhões são crianças”, afirmou Calil.
Percepção social
Segundo o presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso), Bruno Halpern, a percepção de boa parte da população sobre a obesidade é que este é um problema fácil de resolver: bastaria comer menos e se exercitar mais. Ele acha injusto que uma doença que atinge milhões de pessoas seja vista como uma questão individual.
“Será que, quando a gente individualiza, a gente coloca tudo no indivíduo, ‘ah, você tem os seus livres arbítrios, você pode fazer as suas escolhas’, a gente não está exatamente dizendo que a obesidade é uma escolha, sendo que ela é uma doença crônica?", questionou. Ainda segundo Halpern, quando se diz que "a responsabilidade é de cada um, a gente está lavando as mãos como poder público, indústria e assim por diante de buscar soluções".
Bruno Halpern afirmou que a obesidade no Brasil vem crescendo entre as classes sociais mais baixas, por causa da disponibilidade de alimentos ricos em calorias, mas pobres do ponto de vista nutricional. Ao lembrar do direito constitucional à saúde, Maria Edna de Melo, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, elencou providências urgentes como legislações sobre a publicidade de alimentos não saudáveis, a alimentação escolar, a tributação de bebidas açucaradas, além de uma informação melhor à população sobre o que ela está comendo.
“Aquela mulher que mora na periferia, que acorda às 4 da manhã, chega às 7 da noite, vai arrumar a casa, lavar a roupa, fazer o jantar e dormir às 11 horas, quando ela passa no supermercado e vê um pacote de macarrão instantâneo colorido, com vitamina A,B,C,D,E, X, Y, Z, ela tem certeza de que aquilo é bom para seu filho. O que a gente come não é uma escolha simples e não é livre arbítrio, porque a gente tem um marketing direcionando para um maior consumo dos alimentos ultraprocessados”, disse Maria Edna.
História de preconceito
Representantes da sociedade civil apontaram episódios de discriminação, chamada de gordofobia. O nutricionista Erick Cuzziol, que sempre esteve acima do peso, reclamou que os obesos muitas vezes são tratados como se tivessem cometido um crime. Ele relatou preconceito no mercado de trabalho, disse que teve depressão, tentou suicídio e, em um depoimento emocionante, lembrou constrangimentos desde as aulas de Educação Física na infância e na adolescência.
“Eu ia ao médico. Eu pedia ajuda. Eu tomei remédios. Eu passei fome. Eu fiquei quase que a ponto de desmaiar na escola, porque não comer era a saída para finalmente me livrar daquele corpo. E piorava, e só piorava. Parecia assim que aquele tamanho ia, mas, quando ele voltava, ele voltava com uma força maior”, disse.
Muitos participantes da sessão solene elogiaram projeto de lei do deputado Dr. Zacharias Calil (PL 343/03) que está sendo examinado na Câmara e prevê a criação de centros de saúde especializados no tratamento da obesidade. Alexandra Rubim, diretora regional da Sociedade Brasileira de Diabetes no Distrito Federal, explicou como é a rotina em um centro de referência que funciona em Brasília.
“Esses pacientes passam por cinco reuniões educativas, que são online e também presenciais, onde eles aprendem muito sobre a condição, sobre a obesidade; eles aprendem também que eles devem estar sempre atentos e manter o seu cuidado. Depois eles são atendidos mensalmente por toda a equipe, e após dois anos, eles recebem alta e são direcionados novamente para a atenção primária. Se necessário, continuam na especializada e em alguns casos, quando indicados, são encaminhados para a cirurgia bariátrica”, explicou ela.
Durante a sessão solene, também foi mencionado o impacto econômico da obesidade e das doenças crônicas decorrentes dela. O deputado Dr. Zacharias Calil citou dados de um atlas internacional publicados agora em março mostrando que, em 2020, o custo mundial da obesidade era de US$ 1, 96 trilhão (cerca de 10 trilhões de reais), incluindo as despesas nos sistemas de saúde, a queda de produtividade dos trabalhadores e as aposentadorias prematuras.