Estudo feito por consultores de Orçamento da Câmara mostra que as emendas de bancada estadual ao Orçamento da União têm se transformado em emendas individuais. A Comissão Mista de Orçamento debateu em audiência pública as transferências federais para estados e municípios. Pelo estudo, apenas 10% das transferências via emendas de bancada eram dirigidas para obras e serviços estruturantes.
As bancadas de Minas Gerais, Roraima, São Paulo, Tocantins e Distrito Federal destinaram a totalidade das emendas para custeio e outros tipos de investimentos. Eugênio Greggianin, consultor da Câmara, disse que outra evidência da pulverização dos recursos das emendas de bancada foi a de que, em 2022, elas atenderam 2.607 municípios.
O consultor lembrou que, quando foram criadas, as emendas individuais tinham o objetivo de identificar problemas locais e as emendas decididas pelas bancadas estaduais, eram destinadas a obras de maior impacto. Eugênio também criticou as transferências especiais, que são repasses diretos para as prefeituras e que vêm crescendo no Orçamento:
“É um grande problema. Transferência especial você tem certeza que o dinheiro foi para a prefeitura, mas não sabe o que a prefeitura fez. Isso deveria ser corrigido. Eu sei que a ideia da transferência é boa no sentido de agilizar. Ela se aplicaria mais em ações emergenciais e em valores não tão elevados. Obras plurianuais não poderiam receber transferências especiais”, disse.
Desde 2021, as transferências para estados e municípios por meio de emendas parlamentares superam o total feito pelo Executivo. Para 2023, são R$ 32,1 bilhões com recursos de emendas contra R$ 30,8 bilhões por meio de convênios com o governo.
No estudo, encomendado pela deputada Adriana Ventura (Novo-SP), foram identificadas distorções causadas pela falta de critérios objetivos de distribuição dos recursos de emendas. Segundo Eugênio, predominam pequenos municípios do Norte e do Nordeste na lista dos que receberam mais que a média de R$ 107,66 por habitante em 2022.
A cidade de Normandia, em Roraima, tem 11.772 habitantes e recebeu R$ 3.323 por habitante. Para se ter uma ideia, o valor é seis vezes maior que o recebido pela cidade via Fundo de Participação dos Municípios. O fundo distribui recursos dos impostos federais.
Por outro lado, o estudo afirma que 493 municípios com Índice de Desenvolvimento Humano baixo e menos de 20 mil habitantes receberam menos recursos de emendas que a média da faixa, que foi de R$ 227.
O deputado Otoni de Paula (MDB-RJ) disse que muitos defensores do atual sistema de emendas parlamentares afirmam que os congressistas têm mais capacidade de identificar problemas específicos e locais. Mas, segundo ele, as distorções apontadas pelo estudo mostram a limitação do sistema:
“Esses municípios com menor IDH são politicamente menores em termos de votos. E o parlamentar, ele tende a usar o seu recurso nos municípios maiores, aonde há uma concentração de voto maior. E com isso você nunca vai conseguir consertar essa distorção”
O consultor do Senado, Fernando Moutinho, disse que os recursos de transferências feitos por emendas do Legislativo ou pelo Executivo não obedecem a critérios socioeconômicos definidos pela legislação:
“A minha constatação continua sendo que ela virou letra morta em grande parte das transferências voluntárias com exceção parcial de algumas transferências no Sistema Único de Saúde”
O auditor de transferências do Tribunal de Contas da União, Waldemir Paschoiotto, disse que, mesmo na Saúde, é difícil avaliar se a execução dos recursos atende às prioridades das políticas públicas:
“Não existe uma integração de dados para que o Ministério da Saúde possa fazer o monitoramento e avaliação. Então como os estados e os municípios estão executando essas despesas ainda é um vácuo de informação. A gente não tem uma interligação”
Vários gestores dos ministérios estiveram na audiência pública e afirmaram que já obedecem a critérios específicos de distribuição das transferências ou estão implantando sistemas novos. A deputada Adriana Ventura solicitou aos técnicos que enviem cartilhas de orientação para que os parlamentares possam fazer suas emendas ao Orçamento de 2024 com base em dados de políticas públicas.