O deputado Delegado Antônio Furtado (PSL-RJ) anunciou a criação, no âmbito da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara, do que chamou de um "foco de resistência" pela manutenção e aperfeiçoamento da Lei de Alienação Parental.
“Como podemos cuidar melhor dos nossos jovens e crianças e preservar esse pai ou mãe que também é vítima da alienação parental? Isso tem que ser fruto de ponderação de várias visões que possam agregar para que tenhamos uma compreensão mais ampla do fenômeno da alienação parental. E é justamente isso que essa audiência busca: saber o que fazemos hoje e o que podemos fazer depois”, disse.
Uma das propostas levantadas pelo deputado foi a de criminalizar os atos de alienação parental. A representante da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, Raquel Galinatti, concorda. Para ela, algumas condutas previstas na lei de alienação parental podem ser enquadradas em tipos penais que já existem, como difamação, injúria, subtração de menor e desobediência. Ainda assim, ela defende a criação de crimes específicos e com penas maiores.
“A exemplo da inclusão no Código Penal do 147b, que muito ajudou para que o delegado de polícia pudesse representar pelas protetivas de urgência baseado num crime de violência psicológica — que antes tínhamos que remeter a outros crimes elencados no Código. É necessária, sim, tipificação clara, expressa, do crime de alienação parental para que a gente não tenha que fazer exercícios e interpretações hermenêuticas e jurídicas, como se fosse uma colcha de retalhos”, opinou.
Já a psicóloga clínica e jurídica Sandra Baccara é contra a criminalização da alienação parental por entender que os crimes já podem ser punidos na esfera penal e que esses atos são fruto de sofrimento psíquico. Para ela, a Lei de Alienação Parental é pedagógica e preventiva. “É a dificuldade de reconhecer o direito do outro, o direito dos filhos, do ex-parceiro, da ex-parceira, que tem direito a ser feliz em outro casamento ou sozinho", apontou. Para ela, o ato de alienação parental é um pedido de ajuda. "Eu não estou aqui fazendo a defesa do alienador, estou mostrando que, mais do que criminalizar, precisamos de políticas públicas, políticas de defesa da família, da criança e do adolescente, que venham proporcionar condição de vida para nossa sociedade.”
A Lei, aprovada em 2010, considera alienação parental o conjunto de atos praticados pelo pai, mãe ou outro responsável que induzam a criança ou adolescente a repudiar o outro genitor, ou que causem prejuízo aos vínculos do filho com esse genitor. Alguns dos exemplos trazidos pela lei são: desqualificar o genitor; dificultar o contato; omitir informações; apresentar falsa denúncia; mudar para outra cidade sem justificativa.
Denúncias
Em 2018, após denúncias de uso da lei como estratégia de defesa de pessoas, em geral pais, acusadas de abusar sexualmente de seus filhos, a CPI do Senado que investigou maus-tratos contra crianças e adolescentes apresentou projeto de lei (PLS 498/18) para revogar a Lei de Alienação Parental.
Como o abuso sexual é um crime difícil de ser comprovado, a falta de provas acaba sendo usada para acusar a mãe, que é geralmente quem faz a denúncia, de mentir e, portanto, alienar. Esse é o principal argumento que grupos de mães que perderam a guarda de seus filhos em processos de alienação parental apresentam para revogar a lei.
Outro lado
Durante a audiência pública na Comissão de Segurança Pública, foram ouvidos especialistas das áreas de psicologia, direito e polícia, além de representantes de organizações da sociedade civil que defendem direitos de crianças e adolescentes. Todos apresentaram argumentos e estudos para embasar sua defesa à Lei de Alienação Parental, como os que identificam falsas denúncias e consequências negativas da alienação parental para o desenvolvimento da criança. Não foram ouvidos profissionais contrários à lei. Houve acusações contra os grupos de mães que pedem a revogação da lei de espalharem mentiras sobre o tema.
Em entrevista à Rádio Câmara, a coordenadora regional do Coletivo Mães na Luta, Danielle Souza, que reúne mais de uma centena de mulheres que já perderam ou estão ameaçadas de perder a guarda de seus filhos após serem acusadas de alienação parental, falou que o segredo de Justiça impede as mães de contarem os detalhes dos casos para provar que estão dizendo a verdade.
“A criança conta que o papai tocou nela enquanto estava vendo televisão, e os laudos não são aceitos. Imediatamente as mães são acusadas de alienação parental e punidas. É muito fácil defensores da lei falarem que somos mentirosas, mas, a partir do momento que a gente começar a quebrar segredo de Justiça, todos vão ver quem é mentiroso" rebateu. "A criança fica na mão do pai abusador. A criança é retirada à força policial da mãe aos gritos e nunca mais vê essa mãe.”
Ao analisar o pedido de revogação da lei, a senadora Leila Barros propôs, em 2020, a manutenção da norma, mas com alterações. Novo projeto de lei (PL 6371/19) pedindo o fim da lei foi apresentado pela deputada Iracema Portella (PP-PI). Segundo ela, o conceito de alienação parental não é reconhecido pela comunidade científica e diversas entidades internacionais de saúde mental já se manifestaram contra essa teoria. Ainda segundo a parlamentar, especialistas das áreas jurídica e científica também denunciam o uso da norma para favorecer a convivência de crianças com pais abusadores, em detrimento do convívio com a mãe.
Em fevereiro de 2021, o Conselho Nacional de Justiça publicou um documento em que afirma que a “alegação de alienação parental tem sido estratégia bastante utilizada por parte de homens que cometeram agressões e abusos contra suas ex-companheiras e filhos(as) para enfraquecer denúncias de violências e buscar a reaproximação ou até a guarda unilateral da criança ou do adolescente”.