A Câmara dos Deputados aprovou, em primeiro turno, a Proposta de Emenda à Constituição 517/10, do Senado, que quebra o monopólio governamental para permitir a fabricação pela iniciativa privada de todos os tipos de radioisótopos de uso médico. Ainda falta analisar três destaques apresentados pelos partidos ao texto principal na tentativa de retirar trechos da redação, todos pretendem reverter a intenção da PEC de quebrar o monopólio da produção, mesmo teor do destaque apresentado pelo PT que foi rejeitado. A proposta ainda será analisada em segundo turno.
A matéria foi aprovada com o parecer favorável da comissão especial, de autoria do deputado General Peternelli (União-SP).
Atualmente, a produção e a comercialização desses fármacos no Brasil são realizadas por intermédio da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) e seus institutos, como o de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), em São Paulo.
A Constituição já autoriza, sob regime de permissão, a comercialização e a utilização de radioisótopos para pesquisa e uso médico. A produção por empresas privadas, no entanto, só é permitida no caso de radiofármacos de curta duração (meia-vida igual ou inferior a duas horas).
Radioisótopos ou radiofármacos são substâncias que emitem radiação usadas no diagnóstico e no tratamento de diversas doenças, principalmente o câncer. Um exemplo é o iodo-131, que emite raios gama e permite diagnosticar doenças na glândula tireoide.
Ipen
Durante a discussão da PEC 517/10, deputados divergiram sobre a atuação do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), atual fornecedor desses medicamentos.
Relator da proposta, o deputado General Peternelli afirmou que a produção dessas substâncias em quantidade suficiente à demanda depende da abertura de empresas privadas e fim do monopólio do Ipen. “A importância desse tema é muito grande, a ideia não é prejudicar nada, mas ampliar o acesso”, disse. Ele afirmou que a produção do Ipen é voltada a hospitais privados e, com a entrada de atores privados, poderá ser totalmente dedicada ao Sistema Único de Saúde. Ele defendeu ainda que o órgão governamental será o regulador do mercado para impedir o aumento dos preços.
Peternelli sugeriu que os deputados preocupados com a atuação do Ipen diante da concorrência indiquem recursos de suas emendas parlamentares ao Orçamento para fortalecer o órgão.
Presidente da comissão especial que analisou a proposta, o deputado Zacharias Calil (União-GO) avalia que a quebra do monopólio vai ampliar o acesso a tratamentos pela população. “As vantagens que teremos com esta aprovação é promover a segurança sanitária com o fornecimento adequado de radiofármacos, possibilitar maior acesso da população a diagnósticos de câncer e de doenças cardiovasculares”, disse.
O deputado Hiran Gonçalves (PP-RR), favorável à proposta, disse que o Ipen não consegue suprir a demanda e que a produção só foi suficiente porque algumas especialidades médicas foram comprometidas com a pandemia. “Dizer que o Ipen, durante a pandemia, satisfez a necessidade do Brasil é uma meia verdade. Por quê? Porque durante a pandemia tudo parou. Os tratamentos eletivos pararam. As pessoas pararam de fazer tratamentos oncológicos e exames, porque elas saíram dos hospitais”, disse.
Para o deputado Neucimar Fraga (PSD-ES), a quebra do monopólio é benéfica para o setor. “Nós estamos aprovando e permitindo a ampliação da produção desse material e quebrando o monopólio existente, já que é feito por um único fabricante no Brasil. Em um país do tamanho do Brasil, um assunto de tamanho interesse não pode ficar sob a custódia de um único produtor porque, se ele tiver problema, o País todo para”, disse.
Já a deputada Adriana Ventura (Novo-SP) afirmou que a quebra do monopólio permitirá eficiência e modernização do setor.
O deputado José Nelto (PODE-GO) afirmou que a medida vai incentivar o investimento em ciência. “Temos, sim, que quebrar este monopólio, dar oportunidade para que novos cientistas possam realmente trabalhar para fornecer medicamentos, tratamentos e novos aparelhos para aos pacientes em tratamento de câncer no nosso País”, disse.
Para o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), no entanto, o investimento em radiofármacos deveria passar pelo fortalecimento do Ipen. “Como é que se vai reaparelhar e melhorar o Ipen, se as prerrogativas exclusivas que ele tinha serão tiradas? Não se consegue melhorar um órgão se diminuírem a sua estrutura. Então, é uma contradição a colocação desse termo”, criticou.
O deputado André Figueiredo (PDT-CE) também afirmou que o Ipen sofreu um processo de desgaste e não terá infraestrutura para lidar com a entrada do setor privado. “Entregar o setor à mercê da iniciativa privada num ambiente de competitividade sem o Ipen ser dotado da infraestrutura necessária é acabar com o órgão, é acabar com mais uma estatal extremamente imprescindível para a saúde do povo brasileiro e para a pesquisa de radioisótopos”, disse.
Para o deputado Ivan Valente (Psol-SP), a votação não ocorreu em momento oportuno, diante da demissão do diretor do Ipen, Wilson Aparecido Parejo Calvo no início do mês.
Já a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) afirmou que haverá aumento de preços. “Nós queremos, sim, tratar as neoplasias, queremos tratar todas as doenças que necessitam de diagnóstico precoce, de radiofarmácia, de radioisótopo, mas essa PEC vai triplicar o preço desses insumos em saúde, porque vai quebrar o monopólio, o Ipen vai perder sua possibilidade de sustentação”, disse.