Profissionais ouvidos nesta segunda-feira (9), na Câmara dos Deputados, pela Comissão Externa da Primeira Infância alertaram para a demora no diagnóstico dos casos de dermatite atópica, que pode chegar a uma década na rede pública.
O colegiado trabalha para a criação do dia nacional para conscientização sobre essa doença (23 de setembro), como já acontece com a psoríase e a artrite reumatoide, que são consideradas doenças incapacitantes. Esse será o tema de um projeto de lei a ser apresentado nos próximos dias pela comissão. A ideia é divulgar informações sobre a dermatite atópica, bem como debater políticas públicas direcionadas ao tratamento.
Pacientes que sofrem com essa enfermidade apresentam coceiras intensas na pele que, em alguns casos, geram dor e podem causar infecções. Além disso, estão mais predispostos a depressão, insônia, asma, doenças autoimunes e problemas cardíacos.
A doença atinge com maior intensidade crianças na primeira infância e jovens na fase de transição da infância para a adolescência. De 15 a 20% das crianças sofrem de dermatite atópica em algum grau. Entre adultos, essa margem é de 2 a 10%.
Aumento da incidência
No comando do ambulatório de dermatite atópica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) há 15 anos, o médico Omar Lupi alertou que o intervalo de tempo entre a primeira manifestação da doença e o início do tratamento dura em média nove anos e meio.
“É uma década que a criança e a família trafegam no escuro”, disse, apontando um aumento de dez vezes na incidência da alergia nos últimos 30 anos.
“A dermatite atópica não é uma doença de uma só pessoa, é uma doença da família inteira. É do irmão que divide o quarto, é da avó que dorme junto, é da mão e do pai que não dormem a noite e não conseguem trabalhar”, frisou Lupi.
Ele salientou ainda que a doença está relacionada ao aumento de hospitalização por comorbidades, como doenças que afetam o sistema imunológico. “Essas comorbidades têm aumento no custo saúde, impacto na redução da qualidade de vida, da produtividade e um impacto familiar muito grande”, avaliou.
A representante da Associação Crônicos do Dia a Dia (CDD), Bruna Rocha, também se mostrou preocupada com a demora para diagnosticar a doença. Segundo levantamento da instituição, 50% das pessoas levaram mais de 12 meses para serem diagnosticadas e 75% dos entrevistados precisaram consultar mais de três especialistas.
“São pessoas que ficam circulando por muito tempo no sistema de saúde, buscando um nome para aquilo que elas têm. Ter um diagnóstico é um alívio, porque a gente sabe com o que está lidando”, ressaltou.
Impactos mentais
Preocupada com os efeitos da doença na saúde mental de crianças, a deputada Paula Belmonte (Cidadania-DF) falou sobre o risco de agressão psicológica na escola. “Há também rejeição no ambiente social de crianças, por se achar que a doença pode ser transmitida. Elas podem sofrer bullying em razão disso”, comentou a parlamentar, que tem uma filha diagnosticada com dermatite atópica.
Na mesma linha foi o relato da professora Suzana de Almeida Costa Mesquita. “É muito difícil firmar a identidade quando a gente escuta o tempo inteiro coisas ruins a respeito de sua imagem, de seu corpo. Quando você não tem a chance de mostrar quem você é, porque você já é julgado por fora”, contou. Ela descreve seu cotidiano com a doença no perfil “Minha vida com Dermatite”, na rede social Instagram.
“Além do impacto mental, tenho pacientes com ideário suicida”, relatou Omar Lupi. “Já são vários com ajuda de psicólogos e psiquiatras.” Segundo ele, o risco de depressão em pacientes com esse tipo de dermatite é duas vezes maior do que em pessoas que não têm a doença.
“O paciente que tem a crise sabe que tem vários fatores ambientais que podem desencadeá-la, então isso gera ansiedade antes que haja a lesão. Obviamente, isso tem um comprometimento em qualidade de vida”, destacou.
Bruna Rocha citou levantamento da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) pelo qual pessoas com dermatite atópica têm 44% a mais de probabilidade de suicídio. “A gente está falando de crianças e jovens que estão pensando em suicídio em uma taxa muito alta”, lamentou.