O ministro da Educação, Victor Godoy, disse nesta quarta-feira (11), em audiência pública na Câmara dos Deputados, que não teve conversas com os pastores evangélicos Arilton Moura e Gilmar Santos no período em que ocupou a secretaria-executiva da Pasta (2020-2022). Ele foi efetivado no cargo atual no mês passado pelo presidente Jair Bolsonaro, depois que o ex-ministro Milton Ribeiro pediu demissão.
Os dois pastores foram acusados em reportagens da imprensa de participar de um um esquema de tráfico de influência no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que envolveria a cobrança de propinas de prefeitos para a facilitação de acesso a recursos do órgão. O FNDE é uma autarquia do ministério que financia programas na área educacional.
“As únicas vezes em que participei de eventos com as presenças dos pastores citados nas reportagens foi a convite do ministro [Milton Ribeiro], para compor a mesa de abertura”, afirmou Godoy. “Eu não participava da agenda desses pastores”, completou o atual ministro, após pergunta do deputado Kim Kataguiri (União-SP).
Godoy admitiu, porém, ter assinado o ato de nomeação de Arilton Moura para assumir uma função no gabinete de Ribeiro, a pedido deste. Posteriormente, o nome foi vetado pela Casa Civil. Apesar disso, o atual ministro defendeu o antecessor. “Nunca solicitou ou impôs que eu realizasse qualquer ato em desacordo com a legislação”, afirmou.
Godoy prometeu colaborar com as investigações para que as suspeitas sejam esclarecidas. “Durante a minha gestão, não serei leniente com qualquer irregularidade”, disse.
Kits de robótica
Victor Godoy foi ouvido por quase sete horas por três comissões da Casa (de Educação; de Fiscalização Financeira e Controle; e de Trabalho, Administração e Serviço Público). Ele foi convidado para falar sobre os projetos da pasta para 2022 e denúncias de corrupção no FNDE veiculadas na imprensa. Um desses casos envolve o suposto superfaturamento na compra de kits de robótica para escolas sem infraestrutura em municípios de Alagoas e Pernambuco.
O ministro afirmou que a compra dos kits é de responsabilidade dos estados e municípios, cabendo ao FNDE apenas disponibilizar os recursos. “Não há escolha de empresa pelo ministério, não há indicação de qualquer tipo de fornecedor”, declarou. Atualmente, a compra de novos kits está suspensa por decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), que apura o caso a partir de representação do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE).
Godoy também negou superfaturamento na compra de 3.850 ônibus para escolas. Ele afirmou que o FNDE decidiu usar, no pregão, o preço mínimo cotado por veículo antes mesmo que saísse a primeira reportagem sobre o caso, decisão validada pela Controladoria-Geral da União (CGU).
A denúncia também está sendo apurada pelo TCU, que sustou liminarmente a homologação do procedimento licitatório. O processo de aquisição dos ônibus foi alvo de uma representação dos deputados Tabata Amaral (PSB-SP) e Felipe Rigoni (União-ES), e do senador Alessandro Vieira.
Sobre as propostas da pasta para este ano, o ministro informou que a prioridade é enfrentar os efeitos da pandemia, com foco em recuperação das aprendizagens e combate à evasão escolar.
Plano de governo
A exposição do ministro foi criticada por diversos parlamentares. O deputado Marcelo Calero (PSD-RJ) disse não ter sido convencido pelas explicações. “Os esclarecimentos não foram suficientes. Já passou da hora de falarmos de uma CPI. Nós precisamos entender quem tem razão”, comentou.
O deputado Glauber Braga (Psol-RJ), um dos que propuseram a audiência, criticou o governo pelas denúncias de corrupção e pela queda do orçamento da área educacional, o que compromete o cumprimento da meta do Plano Nacional de Educação (PNE) de destinar 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a área. “O PNE foi jogado na lata do lixo”, criticou.
Outro deputado que propôs o debate, Vanderlei Macris (PSDB-SP), disse que o governo não tem projeto educacional e isso é reforçado pelo fato de Godoy ser o quinto ministro da área no governo Bolsonaro em pouco mais de três anos. “Eu não vi ao longo desses anos nenhuma política educacional competente, séria”, apontou Macris.
A crítica pela falta de um projeto nacional também foi reforçada por parlamentares da oposição, como Sâmia Bomfim (Psol-SP), Alice Portugal (PCdoB-BA), Alessandro Molon (PSB-RJ), Jorge Solla (PT-BA) e Professor Israel Batista (PSB-DF).
Sem comprovação
Em contraponto às críticas, parlamentares ligados ao governo negaram a existência de corrupção no ministério. O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) disse que ainda não há nenhuma comprovação das denúncias e que todos os fatos serão apurados e os responsáveis punidos. “Este governo não tem a prática de governos anteriores de jogar a corrupção para debaixo do tapete”, declarou.
O mesmo disse a deputada Liziane Bayer (Republicanos-RS). Ela também criticou os deputados que defenderam o fechamento das escolas durante a pandemia por um tempo superior a outros países, prejudicando os alunos. “Muitos aqui precisam admitir que erraram defendendo o ‘fiquem em casa’.” Por sua vez, a deputada Dra. Soraya Manato (PTB-ES) afirmou que o ensino médio no governo Lula “foi um desastre”.
Obras paradas
O deputado Domingos Sávio (PL-MG) sugeriu ajustes no orçamento do ministério para concluir obras financiadas pelo FNDE, como construção de escolas. “Precisamos o mais rapidamente possível suplementar o [orçamento do] FNDE e não parar essas obras”, disse Sávio. O assunto também foi tratado por outros parlamentares, como Moses Rodrigues (União-CE) e Professora Dorinha Seabra Rezende (União-TO).
Segundo o ministro da Educação, existem 1.072 obras paralisadas (com termo de compromisso com o ente vigente) e 2.574 inacabadas (com termo de compromisso vencido).