11/01/2020 às 09h00min - Atualizada em 11/01/2020 às 09h00min

Sul do Estado arrecadou mais de R$ 287 milhões em impostos municipais em 2019

Os municípios da Região Sul do Espírito Santo arrecadaram, juntos, mais de 287 milhões em impostos em 2019. Esse valor é referente apenas aos impostos municipais, ou seja, aqueles que vão diretamente para os caixas das prefeituras, como IPTU, ISSQN, ITBI e outras taxas. Esses tributos são cobrados para garantir o cumprimento das obrigações públicas perante os cidadãos, como atendimento à população, pagamentos de servidores públicos e investimentos em saúde e educação.

Segundo o professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Eduardo Ozório Nunes dos Santos, mestre em Administração Pública, os tributos municipais são especialmente importantes para as cidades, já que o dinheiro proveniente desses impostos não tem contrapartida. Isso significa que, diferente dos royalties do petróleo, que são carimbados e devem ser usados na infraestrutura das cidades, a arrecadação municipal pode ser usada tanto em obras quanto para custeio da máquina pública.

“Na Constituição há a orientação para que os setores públicos não vinculem esse dinheiro. São impostos sem carimbo e podem ir tanto para obras quanto para pagamento de servidores públicos. A saúde e a educação, claro, já absorvem uma parte dessa receita dentro do modelo que é praticado no país. Mas esses impostos também podem financiar despesas de outros setores”, salienta.

E não são apenas os impostos municipais que pesam no bolso do contribuinte. Há tributos estaduais e federais, que também abocanham uma fatia do salário do trabalhador. E não é pouco. Segundo o impostômetro, em 2019, entre impostos de todas as esferas, o Espírito Santo arrecadou R$ 42,3 bilhões, o que representa 1,65% do total da arrecadação no Brasil.

No mesmo ano, o país arrecadou R$ 2,5 trilhões em impostos. Na prática, cada trabalhador brasileiro teve de trabalhar 153 dias no ano só para pagar esses impostos. E para dar uma ideia de quanto dinheiro o cidadão paga todos os anos para manter a máquina pública, se esses R$ 2,5 trilhões forem aplicados na poupança, é possível ter uma renda de quase R$ 337 mil por minuto, ou R$ 485 milhões por dia.

Um estudo de 2019 do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) mostrou que entre os 30 países com maior carga tributária, o Brasil é o lanterna quando o assunto é retorno dos serviços para a sociedade.

A Irlanda, com uma carga de 23%, é apontada como o país que mais tem retorno sobre o imposto pago. Para dar uma ideia, o Brasil só perde para Cuba entre as nações que mais pagam impostos na América Latina. Trata-se da 15ª carga tributária mais alta do mundo, segundo o IBPT.

Se, de acordo com o estudo do IBPT, o cidadão paga impostos altos, mas nem sempre tem o retorno em serviços e obras, a pergunta é: para onde vai todo esse dinheiro que municípios, Estados e Federação arrecadam? Para o cientista político João Gualberto Vasconcellos, essa é uma pergunta que remonta ao início da República. O coração da política no Brasil é o favor, ou seja, em muitas cidades país afora, a ausência de atividades econômicas é sustentada pela criação desnecessária de empregos públicos. “O emprego público é um ato político por si mesmo. Há um descompasso entre a real necessidade de um funcionário para o trabalho e a necessidade política desse funcionário”, salienta.

Modelo ultrapassado

O modelo institucional das prefeituras no Brasil, continua o cientista político, é totalmente ultrapassado. “É o cargo pelo cargo, não necessariamente vinculado à prestação de serviços. Isso é histórico, não é de hoje. Há algumas décadas, por exemplo, optou-se por alguns serviços terceirizados, como limpeza e segurança. Na prática, isso deveria significar redução de funcionários nas prefeituras. Mas não é o que se vê nos três níveis de governo: municipal, estadual e federal. Quer dizer, notamos que o emprego não é a necessidade de trabalho, mas de alojamento de aliados políticos”.

Gualberto vai além na análise, e cita o desperdício de recursos públicos também nas Câmaras municipais em todo país. “As Câmaras de Vereadores são as instituições políticas mais antigas do país. No Espírito Santo, já existiam vereadores no século XVI, em Vitória. O melhor, sempre foram gratuitas ao contribuinte e funcionavam muito bem. Os militares, quando implantaram as eleições indiretas em capitais e Estados, optaram por pagar os vereadores numa forma de cooptar uma base de apoio. E as Câmaras viraram um lugar de desperdício absurdo de dinheiro do cidadão, já que a lei prevê que o Legislativo pode consumir até 5% da arrecadação municipal. Tínhamos de rever a remuneração dos vereadores, dos assessores e isso só com uma reforma política muito ampla”, assegura.

O dinheiro vai e não volta

“Os repasses têm de ser mais igualitários para os municípios, que é onde as coisas acontecem”. A frase do secretário da Fazenda de Cachoeiro de Itapemirim, Eder Botelho da Fonseca, mostra que nem sempre a distribuição do dinheiro dos impostos é justa.

Na prática, cada cidadão paga, no dia a dia, impostos municipais, estaduais e federais. Os federais são repassados para a União, que depois manda de volta para Estados e municípios. Mas nem sempre a conta é justa.

No ranking dos Estados brasileiros de tributos arrecadados e recebidos, o Espírito Santo figura entre os que pagam muito e pouco recebem do Governo Federal. Em 2018, por exemplo, os capixabas arrecadaram mais de R$ 21,7 bilhões em impostos federais. Em contrapartida, o dinheiro que voltou para os cofres do Estado e das prefeituras, foi de R$ 8,3 bilhões. Os valores constam nos portais da Transparência e da Receita Federal.

“Se observarmos atentamente, é uma discussão que tem de entrar em pauta. O Governo Federal redistribui apenas parte da arrecadação para os Estados e municípios, que é onde tudo acontece. A redistribuição dessas receitas têm de ser repensadas”, explica o secretário.

Segundo ele, os recursos próprios do município, ou seja, aqueles que compõem o Produto Interno Bruto (PIB) municipal, tem destino próprio e nem sempre é suficiente diante do custeio, por isso a necessidade de se repensar a redistribuição dos demais tributos.

“Não podemos medir uma cidade pela outra, mas em Cachoeiro temos um quadro de servidores em que metade é de efetivos, outra parte são de vagas em designação temporária que poderão ser absorvidas por aqueles que passarem em concursos em andamento e há 300 vagas preenchidas por comissionados que, num universo de seis mil funcionários, é quase nada”, avalia.

E, na prática, como grande prestador de serviços nas áreas de saúde e educação, entre outros, o município usa 50% das receitas para cobrir justamente essa folha de pagamento. “A outra metade vai para serviços essenciais com limpeza pública, iluminação, além de obras de infraestrutura, a assistência social, segurança pública e outros investimentos feitos na cidade”, contabiliza o secretário.

Se o montante, aparentemente, é alto, as demandas por serviços é ainda maior, continua. “Temos de levar em conta que os investimentos em uma cidade com 200 mil habitantes é grande. E os investimentos com recursos próprios precisam ser gerenciados para o custeio, como pessoal, limpeza pública, iluminação. Isso é obrigatório. O que sobra, vai para os investimentos. Por isso que falamos que é no município, onde tudo acontece, precisam de uma fatia maior desses recursos”.

2020: O ano da reforma tributária
Além de altos, os impostos no Brasil são um emaranhado de siglas que, seguramente, causam confusão nos mais antenados empreendedores e cidadãos. Segundo relatório o Banco Mundial (Doing Business 2019), uma empresa brasileira leva 1.958 horas para pagar tributos. O segundo colocado, Bolívia, leva 1.025 horas. E a média de 190 países pesquisados é de 206 horas. Além de trabalhar muito para ganhar o dinheiro dos impostos, o empreendedor ainda gasta um tempo valioso para deixar a empresa em dia.

Diante desse cenário, a prioridade do Congresso para este ano já está definida: será a reforma tributária. E a expectativa é de que o texto seja aprovado e promulgado ainda no primeiro semestre de 2020.

Tramitavam duas propostas no Congresso, sendo uma na Câmara dos Deputados e outra no Senado. No final de 2019, foi instalada no Congresso a comissão mista, formada por deputados e senadores, para unificar os textos das duas Casas. Câmara, Senado e governo devem voltar a se reunir em fevereiro deste ano para acertar a tramitação.

A reforma deve ter quatro fases. Na primeira, vai se criar um imposto federal de valor agregado em troca da unificação do PIS e do Cofins. O segundo passo será transformar o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) em um imposto seletivo, incidindo só sobre a produção de itens como cigarros e bebidas, mercadorias cujo consumo é desestimulado. A terceira etapa das mudanças incluirá a desoneração da folha de pagamentos e, por último, serão feitas modificações no Imposto de Renda (IR).


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